Não é raro se deparar com a visão de uma abordagem policial no dia a dia. Todavia, há um certo tipo de discriminação pelos agentes policiais quando é realizado a abordagem, na condição do aumento de atos de violencia fisica e psicologica, que são geralmente direicionados a sujeitos homens, jovens, negros e pobres,
Surge então a extrapolação do poder do agente policial diante do cidadão, que de maneira precipitada e infundada, associa determinados perfis de sujeitos a criminalidade, sujeitando e acarretando em constrangedoras cenas de violência em nome da “segurança publica”.
De início, é importante salientar que o Código Processo Penal Brasileiro, em seu artigo 240, §2ª, possui a previsão da revista pessoal sem a necessidade de mandado expedido pelo Juiz, desde que a abordagem seja realizada apenas quando existir indícios de “fundada suspeita” de que o indivíduo esteja envolvido com alguma prática criminosa.
Art. 240. A busca será domiciliar ou pessoal.
§ 1o Proceder-se-á à busca domiciliar, quando fundadas razões a autorizarem, para:
a) prender criminosos;
b) apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos;
c) apreender instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados ou contrafeitos;
d) apreender armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crime ou destinados a fim delituoso;
e) descobrir objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu;
f) apreender cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou em seu poder, quando haja suspeita de que o conhecimento do seu conteúdo possa ser útil à elucidação do fato;
g) apreender pessoas vítimas de crimes;
h) colher qualquer elemento de convicção.
§ 2o Proceder-se-á à busca pessoal quando houver fundada suspeita de que alguém oculte consigo arma proibida ou objetos mencionados nas letras b a f e letra h do parágrafo anterior.
Contudo, o legislador deixou o conceito de “fundada suspeita” em aberto, tornando-se critério do agente policial a forma que se dará a abordagem e a busca pessoal. Diante disso, entra a ideia da responsabilização objetiva do Estado pelo servidor público que ensejou em dano durante as suas atribuições.
Dispõe o artigo 37, §6ª da Constituição Federal: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”
O Autor Yussef Said Cahali (in Responsabilidade Civil do Estado, São Paulo Revista dos Tribunais, 1982, p.178), leciona sobre a responsabilidade do Estado no seguinte contexto:
“Dispondo o Estado de verbas expressivas extraídas da arrecadação tributária aos organismos policiais cometidos da função de segurança pessoal e coletiva, impõe-se-lhe, à sua conta e risco, o correto recrutamento daqueles que, para o seu desempenho, recebem uma farda representativa e uma arma de fogo. Daí reconhecer-se a responsabilidade civil do Estado mesmo naqueles casos de manuseio disparado da arma, causador de danos à integridade física dos particulares, percuciência a responsabilidade do agente.”
Prescindindo então da aferição de culpa do agente administrativo, mediante o acometimento de um ato ilícito e presente o nexo de causalidade a um resultado danoso, ressalvada a hipótese de ter sido culpa exclusiva do lesado, é devido a indenização à vítima.
Pois o sujeito vitimado por atuação policial excessiva e desproporcional, terá como comprovado a violação de sua honorabilidade e dignidade, a vista que fora submetido a situação vexatória e detido sem que as formalidades legais fossem cumpridas, ensejando a germinação do dano moral.
O Superior Tribunal de Justiça, possui precedentes que realça a responsabilidade civil quando demonstrado o abuso na ação policial, e como modo de exemplo, trago a seguinte decisão do Relator Ministro Castro Meira:
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. POLICIAL À PAISANA QUE SE IDENTIFICA. NEXO DE CAUSALIDADE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. 1. É objetiva a responsabilidade civil do Estado por ação de policial à paisana que se envolve em tiroteio em transporte público, resultando na morte de passageiro. 2. Deve ser reconhecida a responsabilidade do Estado, ante a presença do liame entre a atuação administrativa, com a participação do policial, ainda que fora do estrito exercício da função, e o dano suportado por terceiro. Precedente do STF. 3. Recurso especial provido. (REsp 976.073/SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 24/06/2008, DJe 12/08/2008).
Apesar da atuação dos agentes estatais gozarem de presunção de legalidade e veracidade, seus atos devem estar pautados pela proporcionalidade e razoabilidade. É evidente que este tipo de abordagem além de desnecessário, foge do âmbito da previsibilidade das relações sociais e excede a esfera do mero aborrecimento decorrente da dinâmica da vida em sociedade e das ações administrativas respaldada pelo legislador, qualificando-se como ofensa aos atributos intrínsecos da sua personalidade, legitimando a outorga de compensação pecuniária pelo dano moral suportado
Portanto, a responsabilidade civil derivada de ofensa à integridade física, moral ou à imagem de qualquer pessoa adquirirá outro patamar, uma vez que o cabimento da indenização já não depende da caracterização ou ocorrência de qualquer prejuízo material efetivo, bastando, para sua caracterização, tão somente a ocorrência do ato lesivo e seu reflexo na personalidade do ofendido. E não se trata, apenas, de pagar a dor do lesado, ainda que não tenha enfrentado qualquer desfalque patrimonial, mas, de compensação pecuniária como forma de atenuar os danos ao seu patrimônio moral que lhe foram impregnados pela ação lesiva dos agentes públicos.