A Lei nº 6.766/79 estabeleceu os requisitos para o parcelamento do solo urbano, de acordo com as diretrizes urbanas e de meio ambiente. Todo imóvel que não seguiu os parâmetros da norma para o referido parcelamento pode ser considerado como irregular.
Mas o que é o parcelamento do solo urbano?
O parcelamento do solo urbano é, basicamente, dividir uma área em vários lotes a fim de ter vários imóveis para vender. Pode ser realizado tanto por um loteamento quanto por desmembramento.
O loteamento é a divisão de gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou de prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes.
O desmembramento é similar, contudo, na divisão dos lotes destinados a edificação há o aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique a abertura de novas vias ou logradouros públicos e nem na modificação dos já existentes.
Entretanto, para poder realizar um loteamento, o dono do lote precisará atender aos requisitos do Art 4º da Lei nº 6.766/79[1], além de apresentar o projeto do loteamento para a Prefeitura Municipal.
Ocorre que alguns donos de lotes não querem passar pela burocracia e pelos gastos do parcelamento, portanto, loteiam ou desmembram o lote sem a autorização da Município. Com isso, acabam vendendo estes glebas irregulares, o que acarretará prejuízo aos compradores, porque esses podem inclusive perder o imóvel que adquiriram.
Ao verificar que o imóvel comprado faz parte de um parcelamento irregular do solo, o adquirente deve notificar o vendedor para que proceda a regularização da área[2]. Nos casos em que os adquirentes optem por suspender o pagamento das parcelas referentes aquisição das glebas, o mesmo, deverá realizar o depósito das prestações devidas junto ao Registro de Imóveis competentes, que as depositará em estabelecimento de crédito em conta, com incidência de juros e correção monetária. Esta conta só terá movimentação se obtiver prévia autorização judicial.
Tanto a Prefeitura Municipal quanto o Ministério Público poderão promover a notificação do loteador.
Além disso, o Ministério Público também possui legitimidade para pleitear o reconhecimento da irregularidade do solo, conforme estabelece o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
- AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DEMANDA PARA A DEFESA, EM JUÍZO. IMPLANTAÇÃO DE PARCELAMENTO DO SOLO CLANDESTINO E A PRETENSÃO DE REGULARIZAÇÃO OU DE EVENTUAL RESSARCIMENTO DE ADQUIRENTES, COM CONSEQÜENTE INDENIZAÇÃO POR DANOS URBANÍSTICOS E AMBIENTAIS. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL.
I – Asseverou-se, no Tribunal de origem, que o Ministério Público do Estado de São Paulo não teria legitimidade para pleitear o reconhecimento da irregularidade do loteamento, pois apenas os compradores dos lotes a teriam, já que o direito perseguido seria individual e disponível. II – As condições da ação devem ser averiguadas segundo a teoria da asserção, sendo definidas da narrativa formulada inicial e não da análise do mérito da demanda (REsp 1582176/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/09/2016, DJe 30/09/2016).
III – O parcelamento irregular de solo urbano ofende tanto a ordem urbanística como o meio ambiente, razão pela qual se encontra legitimado o Ministério Público. Nesse sentido: REsp 897.141/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/10/2008, DJe 13/11/2009; AgRg no Ag 928.652/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/02/2008, DJe 13/11/2009) IV – No que se refere ao direito de reparação dos compradores, mesmo se for considerado um direito individual homogêneo disponível, o Ministério Público também tem legitimidade para a propor a referida demanda. Nesse sentido: AgRg nos EDcl nos EDcl no REsp 1499300/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/09/2016, DJe 29/09/2016; REsp 743.678/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/09/2009, DJe 28/09/2009.
V – Correta a decisão recorrida que deu provimento ao recurso especial para anular as decisões ordinárias, reconhecidas a legitimidade e o interesse de agir do Ministério Público do Estado de São Paulo, para exame do mérito da ação civil pública.
VI – Agravo interno improvido.
(AgInt no REsp 1261120/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/11/2017, DJe 27/11/2017).
É importante ressaltar que em loteamentos irregulares, as cláusulas de rescisão de contrato por inadimplemento do adquirente – ou seja quando o comprador deixa de pagar as parcelas – é nula. Portanto o parcelamento regular do solo é uma segurança não somente para o adquirente, mas também para o loteador.
E qual é o procedimento para regularizar o loteamento?
O parcelamento do solo não constitui direito subjetivo do proprietário da gleba, ou seja, é possível que o requerimento para regularizar o lote seja negado. Isso porque é apenas uma autorização concedida pelo Município a um particular para o exercício da função pública de urbanização que, em regra, é privativa do Poder Público.
Por isso é imprescindível que os requisitos sejam cumpridos para maximizar as chances de aprovação do projeto de regularização.
O primeiro passo é a solicitação à Prefeitura Municipal ou Distrito Federal, quando for o caso, das diretrizes para o uso do solo, do traçado dos lotes, do sistema viário, dos espaços livres e das áreas reservadas para equipamento urbano e comunitário[3].
Para obter a solicitação o interessado deverá apresentar um requerimento e a planta do imóvel.
O segundo passo consiste na indicação pela Prefeitura Municipal, nas plantas apresentadas com o requerimento, de acordo com as diretrizes de planejamento estadual e municipal.
As indicações da Prefeitura Municipal possuem um prazo máximo de quatro anos. Porém, se o Município tiver menos do que 50.000 habitantes e o seu plano diretor já disponibilizar as diretrizes de urbanização para a zona em que o parcelamento se encontra, é possível a dispensa desta etapa.
Cabe ressaltar que nesta etapa é preciso também solicitar a consulta prévia de viabilidade do empreendimento junto ao órgão de gestão metropolitana.
O terceiro passo para a aprovação do loteamento é a apresentação do projeto de parcelamento junto à Prefeitura Municipal.
Com a aprovação do projeto de loteamento, esse deve ser executado no prazo constante no cronograma de execução, caso contrário perde a sua aprovação. Em regra, a Lei Municipal deverá definir o prazo para a aprovação do projeto de parcelamento, porém nos casos em que a lei for omissa, entende-se o prazo para a aprovação ou não do projeto será de 90 dias e de 60 dias para o aceite ou não das obras.
Estando o projeto aprovado, o loteador terá de solicitar o registro do loteamento ao Cartório de Registro de Imóveis competente em um prazo de até 180 dias, de modo a se realizar a individualização das matrículas dos lotes.
.
[1] Art. 4o. Os loteamentos deverão atender, pelo menos, aos seguintes requisitos:
I – as áreas destinadas a sistemas de circulação, a implantação de equipamento urbano e comunitário, bem como a espaços livres de uso público, serão proporcionais à densidade de ocupação prevista pelo plano diretor ou aprovada por lei municipal para a zona em que se situem
II – os lotes terão área mínima de 125m² (cento e vinte e cinco metros quadrados) e frente mínima de 5 (cinco) metros, salvo quando o loteamento se destinar a urbanização específica ou edificação de conjuntos habitacionais de interesse social, previamente aprovados pelos órgãos públicos competentes;
III – ao longo das águas correntes e dormentes e das faixas de domínio público das rodovias e ferrovias, será obrigatória a reserva de uma faixa não-edificável de 15 (quinze) metros de cada lado, salvo maiores exigências da legislação específica;
IV – as vias de loteamento deverão articular-se com as vias adjacentes oficiais, existentes ou projetadas, e harmonizar-se com a topografia local.
§ 1o A legislação municipal definirá, para cada zona em que se divida o território do Município, os usos permitidos e os índices urbanísticos de parcelamento e ocupação do solo, que incluirão, obrigatoriamente, as áreas mínimas e máximas de lotes e os coeficientes máximos de aproveitamento
§ 2o – Consideram-se comunitários os equipamentos públicos de educação, cultura, saúde, lazer e similares.
§ 3o Se necessária, a reserva de faixa não-edificável vinculada a dutovias será exigida no âmbito do respectivo licenciamento ambiental, observados critérios e parâmetros que garantam a segurança da população e a proteção do meio ambiente, conforme estabelecido nas normas técnicas pertinentes
§ 4o No caso de lotes integrantes de condomínio de lotes, poderão ser instituídas limitações administrativas e direitos reais sobre coisa alheia em benefício do poder público, da população em geral e da proteção da paisagem urbana, tais como servidões de passagem, usufrutos e restrições à construção de muros
[2]Art. 38. Verificado que o loteamento ou desmembramento não se acha registrado ou regularmente executado ou notificado pela Prefeitura Municipal, ou pelo Distrito Federal quando for o caso, deverá o adquirente do lote suspender o pagamento das prestações restantes e notificar o loteador para suprir a falta.
§ 1º Ocorrendo a suspensão do pagamento das prestações restantes, na forma do caput deste artigo, o adquirente efetuará o depósito das prestações devidas junto ao Registro de Imóveis competente, que as depositará em estabelecimento de crédito, segundo a ordem prevista no inciso I do art. 666 do Código de Processo Civil, em conta com incidência de juros e correção monetária, cuja movimentação dependerá de prévia autorização judicial.
§ 2º A Prefeitura Municipal, ou o Distrito Federal quando for o caso, ou o Ministério Público, poderá promover a notificação ao loteador prevista no caput deste artigo.
§ 3º Regularizado o loteamento pelo loteador, este promoverá judicialmente a autorização para levantar as prestações depositadas, com os acréscimos de correção monetária e juros, sendo necessária a citação da Prefeitura, ou do Distrito Federal quando for o caso, para integrar o processo judicial aqui previsto, bem como audiência do Ministério Público.
§ 4º Após o reconhecimento judicial de regularidade do loteamento, o loteador notificará os adquirentes dos lotes, por intermédio do Registro de Imóveis competente, para que passem a pagar diretamente as prestações restantes, a contar da data da notificação.
§ 5º No caso de o loteador deixar de atender à notificação até o vencimento do prazo contratual, ou quando o loteamento ou desmembramento for regularizado pela Prefeitura Municipal, ou pelo Distrito Federal quando for o caso, nos termos do art. 40 desta Lei, o loteador não poderá, a qualquer titulo, exigir o recebimento das prestações depositadas.
[3] Art. 6o. Antes da elaboração do projeto de loteamento, o interessado deverá solicitar à Prefeitura Municipal, ou ao Distrito Federal quando for o caso, que defina as diretrizes para o uso do solo, traçado dos lotes, do sistema viário, dos espaços livres e das áreas reservadas para equipamento urbano e comunitário, apresentando, para este fim, requerimento e planta do imóvel contendo, pelo menos:
I – as divisas da gleba a ser loteada;
II – as curvas de nível à distância adequada, quando exigidas por lei estadual ou municipal;
III – a localização dos cursos d’água, bosques e construções existentes;
IV – a indicação dos arruamentos contíguos a todo o perímetro, a localização das vias de comunicação, das áreas livres, dos equipamentos urbanos e comunitários existentes no local ou em suas adjacências, com as respectivas distâncias da área a ser loteada;
V – o tipo de uso predominante a que o loteamento se destina;
VI – as características, dimensões e localização das zonas de uso contíguas