O novo Coronavírus (COVID-19), transmitido pelo vírus Sars-Cov-2, causou uma crise de saúde e econômica de proporções globais. Diante da pandemia, os empreendedores enfrentam o desafio de conseguir manter o seu negócio sem poder realizar as vendas de forma física e tendo de arcar com todo o passivo do negócio.
Este guia visa subsidiar as escolhas do empreendedor, apresentando todas as opções legalmente possíveis neste momento, seja de suspender contratos de trabalho, demitir funcionários e até viabilizar novos meios de manter o seu negócio.
O QUE FAZER COM OS FUNCIONÁRIOS?
Após ter tido a decretação de que o Brasil está em estado de calamidade, diversos Estados emitiram normas que obrigam os comerciantes a fechar temporariamente os seus negócios na modalidade física, ou seja, o local da loja.
Ressalta-se que ainda é possível fazer vendas na modalidade on-line e via delivery. Porém, com a evidente queda que haverá no consumo, ainda mais de itens ditos supérfluos, muitos empreendedores terão níveis de venda muito abaixo do necessário para manter o emprego.
Portanto não se sabe o que seria o melhor a fazer com os funcionários, principalmente os das atividades que não permitem o teletrabalho ou home office.
I.I REGRAS ATUAIS DA CLT. COMPARAÇÃO ENTRE DEMISSÃO E SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. QUAL A MELHOR OPÇÃO SE NENHUMA MEDIDA FOR TOMADA PELO GOVERNO?
Considerando que a Medida Provisória nº 927 de 2020 terá parte dela revogada, manterei este tópico. Se o Governo não apresentar auxílio aos empreendedores, estes devem demitir ou suspender o contrato de trabalho dos funcionários?
Neste caso específico, o ideal seria demitir. Isso porque a suspensão do contrato de trabalho, nos moldes da CLT não cabe nessa situação.
O art. 476-A da CLT determina que o contrato de trabalho poderá ser suspenso, por um período de 2 a 5 meses nas seguintes ocasiões:
Participação do emprego em curso ou programa de qualificação profissional, oferecido pelo empregador;
O curso tem que ter duração equivalente à suspensão contratual mediante previsão em convenção ou acordo coletivo de trabalho e aquiescência formal do empregado
Após a autorização concedida por intermédio de convenção ou acordo coletivo, o empregado deverá notificar o respectivo sindicato, com antecedência mínima de 15 dias da suspensão contratual.
Os empreendedores não têm 15 dias para fazer uma convenção ou acordo coletivo com o sindicato e nem capital para elaborar um curso ou pagar um para seus funcionários.
- Na opção da demissão, a CLT determina que o empregador deverá:
- anotar na Carteira de Trabalho e Previdência Social
- comunicar a dispensa aos órgãos competentes
- realizar o pagamento das verbas rescisórias
- pagar a indenização pela rescisão de contrato por prazo indeterminado que é de 1 mês de remuneração por ano de serviço, ou por ano e fração igual ou superior a 6 meses[1]
DEMISSÃO. FORÇA MAIOR. ACORDO DE DEMISSÃO. VERBAS DEVIDAS.
VERBAS DEVIDAS POR DEMISSÃO
A demissão por conta do coronavírus não é considerada demissão por justa causa, visto que não se enquadra nos requisitos para essa modalidade. Portanto havendo a dispensa do funcionário será preciso o pagamento das verbas conforme a demissão sem justa causa, quais sejam:
- saldo de salário, correspondente
aos dias trabalhados pelo empregado
- aviso prévio – no caso de fechamento imediato da empresa, será o indenizado, que será proporcional ao tempo de serviço
- férias vencidas e proporcionais acrescidas de 1/3
- 13º salário
- Liberação dos valores depositados no FGTS, acrescidos de multa de 40%
- Entrega das guias para solicitação do seguro desemprego.
O empregador possui até 10 dias para pagar as verbas rescisórias e entregar a documentação referente, sendo que, caso não seja respeitado tal prazo, arcar com uma multa no valor de um salário.
E se fizer acordo?
Se o contrato de trabalho for extinto por acordo entre empregado e empregador as verbas devidas serão
- por metade
- o aviso prévio, se indenizado,
- a indenização sobre o saldo do FGTS
- na integralidade todas as demais verbas trabalhistas
Mas eu tenho que pagar tudo isso mesmo a paralisação do trabalho tendo sida determinada pelo Governo?
O art. 486 da CLT determina que no caso de paralisação temporária ou definitiva do trabalho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilita a continuação da atividade, prevalecerá o pagamento da indenização, que ficará a cargo do governo responsável.
Sempre que o empregador invocar em sua defesa esse artigo, o tribunal do trabalho competente notificará a pessoa de direito público apontada como responsável pela paralisação do trabalho, para que, em 30 dias alegue a sua defesa.
Apesar disso, vemos esse artigo como uma opção de emergência caso nada mais possa ser feito. O melhor é tentar pelo acordo ou pelo pagamento das verbas pois uma ação judicial julgada em desfavor do comerciante pode ser a responsável por fechar o seu negócio.
Demissão de funcionário estável: estável é o empregado com mais de 10 (dez) anos de serviço na mesma empresa. Ele só pode ser demitido por motivo de falta grave ou circunstância de força maior devidamente comprovadas. Art. 492 CLT.
Se não houver a comprovação do motivo de força maior, e a empresa se extinguir, o empregado estável demitido tem garantia à:
- Indenização por rescisão do contrato por prazo indeterminado, paga em dobro
- Demais verbas trabalhistas.
O QUE É FORÇA MAIOR? E O QUE ISSO PODE AJUDAR O EMPREGADOR?
Força maior é todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregado, e para a realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente.
Ao nosso ver, estando o país em estado de calamidade e tendo o fechamento forçado das atividades, evidente é a configuração da força maior neste caso.
É preciso haver a comprovação de que a força maior afetou substancialmente ou é suscetível de afetar a situação econômica e financeira da empresa. Caso contrário não se aplicam os “benefícios” da força maior.
Configurado o motivo de força maior que determine a extinção da empresa, ou de um dos estabelecimentos em que trabalhe o empregado, é assegurado a este a indenização da seguinte forma:
- Sendo estável, as mesmas verbas
- Não tendo direito à estabilidade, metade do que seria devido em caso de rescisão sem justa causa, o que é igualmente aplicável aos contratos de prazo determinado.
A CLT também permite em caso de força maior ou prejuízos comprovados, a redução geral de salários dos empregados da empresa, proporcionalmente aos salários de cada um, não podendo, entretanto, ser superior a 25%.
QUADRO COMPARATIVO
DEMISSÃO S/ JUSTA CAUSA | ACORDO DE RESCISÃO | DEMISSÃO POR FORÇA MAIOR |
Não precisa encerrar a empresa | Não precisa encerrar a empresa | Precisa ter o fechamento da empresa ou do estabelecimento. |
Verbas devidas: saldo de salário, aviso prévio, férias vencidas e proporcionais + 1/3, 13º salário, liberação dos valores do FGTS + multa de 40%, entrega das guias para solicitação do seguro desemprego. | Verbas devidas: metade do aviso prévio, se indenizado e metade da indenização sobre o saldo do FGTS (ou seja, multa de 20%). Integralidade das demais verbas | Verbas devidas: se o empregado for estável nada muda, são devidas as verbas pela demissão + indenização em dobro. Se não for estável, todas as verbas são devidas pela metade. |
A força maior também permite a redução dos salários em no máximo 25% para evitar o desemprego caso a empresa não tenha fechado. |
O QUE O GOVERNO JÁ PROPÔS PARA FACILITAR A VIDA DO EMPREENDEDOR DURANTE A CALAMIDADE DO COVID-19?
Para dar mais capital de giro para as empresas, o governo suspendeu por três meses o prazo para empresas pagarem o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e a parte referente à parcela da União no Simples Nacional;
Nesse sentindo ainda, as contribuições devidas ao Sistema S sofrerão redução de 50% por três meses para não afetar o caixa das empresas;
O governo antecipou a segunda parcela do 13º salário de aposentados e pensionistas do INSS para o mês de maio.
Para colocar ainda mais recursos na praça para movimentar a economia, vai transferir os valores não sacados do PIS/Pasep para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para permitir novos saques e antecipar para junho o pagamento do abono salarial;
Cortaram temporariamente o IPI para bens produzidos internamente ou importados, que sejam necessários ao combate do Covid-19;
Facilitaram a renegociação de operações de créditos de empresas e de famílias dispensando os bancos de aumentarem a poupança que têm de deixar em caixa (provisionamento) caso essa repactuação ocorra nos próximos seis meses;
Deram mais artilharia aos bancos para realizar as eventuais renegociações e de manter o fluxo de novos empréstimos porque baixaram a necessidade de capital próprio para a chamada “alavancagem”. Na prática, os bancos vão precisar ter menos dinheiro em caixa para fazerem as operações. Só essa mudança pode aumentar a capacidade de concessão de crédito em torno de R$ 637 bilhões.
A taxa de juros do empréstimo consignado para aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) passará dos atuais 2,08% ao mês para 1,80% ao mês, enquanto a taxa para o cartão de crédito será reduzida de 3% ao mês para 2,70% ao mês;
Reduziram a zero as alíquotas de importação de produtos de uso médico-hospitalar.
Camex zera Imposto de Importação de 50 produtos para o combate ao coronavírus. A Resolução abrange desde luvas, máscaras e álcool etílico até respiradores, para facilitar o atendimento da população e minimizar os impactos econômicos da pandemia;
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) suspenderá atos de cobrança e facilitará a renegociação de dívidas em decorrência da pandemia. As medidas serão publicadas no Diário Oficial da União;
A Receita Federal simplifica despacho aduaneiro de produtos de uso médico-hospitalar destinados ao combate da Covid-19;
Suspensão, por cento e vinte dias, da exigência de recadastramento anual de aposentados, pensionistas e anistiados políticos civis, e também da realização de visitas técnicas, para comprovação de vida.
O Governo anunciou a criação de um auxílio emergencial no valor R$ 200, por pessoa, durante três meses, para apoiar trabalhadores informais, desempregados e microempreendedores individuais (MEIs) que integrem família de baixa renda. A medida vai beneficiar de 15 a 20 milhões de brasileiros e injetar até R$ 5 bilhões por mês na economia custeados com recursos da União.
Esse auxílio emergencial não pode ser acumulado com benefícios previdenciários, Benefício de Prestação Continuada (BPC), Bolsa Família ou seguro-desemprego;
Criação de programa para evitar demissões neste período de pandemia. O Ministério da Economia vai criar o Programa Antidesemprego. O objetivo da iniciativa é facilitar as negociações trabalhistas de modo a reduzir os custos do contrato de trabalho e preservar os vínculos empregatícios, dentro dos limites previstos na Constituição Federal;
O programa prevê a adoção das seguintes medidas: teletrabalho, antecipação de férias individuais, decretação de férias coletivas, adoção e ampliação de banco de horas, redução proporcional de salários e jornada de trabalho, antecipação de feriados não religiosos, além do diferimento do recolhimento do FGTS durante o estado de emergência, que já havia sido anunciado;
II.I O GOVERNO PODE APROVAR MAIS? SIM!
O Ministério da Economia já aceitou os pleitos do setor aéreo e turístico para ajudar na manutenção das empresas e do emprego.
Ontem a Confederação Nacional da Indústria apresentou um pacote de medidas ao Ministro da Economia para facilitar o setor industrial. O Sebrae tem feito a pressão para o comércio. Nossa recomendação é esperar até a próxima semana para decidir sobre as demissões, visto que é possível que estas medidas sejam adotadas.
MEDIDAS PROPOSTAS PELA CNI[2]
- Regras mais flexíveis para a suspensão temporária do contrato de trabalho para que seja sem o recebimento de salário pelo trabalhador.
- Que os contratos de trabalho possam ser suspensos com uma carência menor, de até 48 horas.
- Dispensa dos cursos de qualificação para a suspensão do contrato.
- Redução proporcional do trabalho e dos rendimentos sem precisar da concordância do empregado.
- Que a redução possa ser até 50% do valor do salário.
- Os salários dos empregados afastados, nos primeiros 15 dias, sejam custeados pela Previdência Social.
- Permissão de turnos mistos alternados entre teletrabalho e trabalho presencial.
- Ampliação do banco de horas, para ser fixado unilateralmente pela empresa, prevendo prazo de compensação de até 2 anos.
- Redução das exigências para realização do teletrabalho.
- Permissão expressa de alteração de horários de trabalho.
- Reativação do programa-seguro emprego.
- Permissão de compensação de dias não trabalhados do período de férias.
- Não aplicação de multas por conta da crise.
- Suspensão, durante a crise, dos registros administrativos.
- Ampliação do prazo para realização de exames ocupacionais,
- Suspensão temporária dos prazos de contestação e de recursos administrativos.
- Exclusão do coronavírus como doença relacionada ao trabalho.
- Adiamento por 90 dias do pagamento de todos os tributos federais, incluindo as contribuições previdenciárias e o parcelamento do pagamento do valor dos tributos que tiverem o recolhimento adiado.
- Prorrogação, por 90 dias, do prazo para apresentação das obrigações acessórias das empresas, e a dispensa do pagamento, por igual prazo, e sem multas, de parcelas de programas de refinanciamento de dívidas com a União.
MEDIDAS PROPOSTAS PELO SEBRAE[3]. Pronunciamento do SEBRAE.
“O Sebrae considera como fundamentais iniciativas em 4 frentes direcionadas aos pequenos negócios: redução de custos, viabilização de fluxo de caixa, manutenção de empregos e orientação. Já estamos agindo em parceria com órgãos de governo, nas instâncias federal, estadual e municipal, para articulação de políticas públicas que possam mitigar o impacto negativo do ponto de vista econômico. Estamos divulgando um conjunto de medidas detalhadas para adoção imediata pelos pequenos negócios, com recomendações bem práticas de como se preparar para enfrentar os dias difíceis que parecem se anunciar.
A estratégia do Sebrae é buscar iniciativas para melhorar o fluxo de caixa das empresas, com possibilidade de prorrogação do prazo para pagamento de tributos, empréstimos bancários, fornecedores e tarifas de concessionárias e liberação de linhas de crédito em condições especiais. Para a situação do emprego, deve-se buscar a ampliação e simplificação do uso de banco de horas, férias coletivas, redução e ou escalonamento de jornada de trabalho, home office e a suspensão de contrato de trabalho com direito ao seguro desemprego por período limitado. Precisamos também de campanhas de esclarecimento setoriais para facilitar a gestão da crise, em sintonia com órgãos públicos.
A pandemia chega exatamente quando as micro e pequenas empresas dão mostras vigorosas da sua contribuição para a retomada do crescimento econômico, com a criação de 731 mil novas vagas de carteira assinada em 2019, na liderança portanto do combate ao desemprego. Derrotar o coronavírus tem, assim, uma dupla missão. De um lado, proteger a saúde dos brasileiros e salvar vidas. De outro, quanto mais bem-sucedido for o enfrentamento da doença, mais rapidamente teremos garantida a retomada da agenda de desenvolvimento da economia.
Nesse momento de gravidade para o Brasil, precisamos agir rápido e com muita eficiência, sem, contudo, ceder ao pessimismo. Já se disse que o pânico é o medo associado à desinformação –vamos combater esses 3 males, com determinação, na certeza de que derrotaremos também o mal maior, que é o próprio coronavírus. Estamos confiantes que, com a orientação e apoio adequados, os empreendedores dos pequenos negócios vão superar mais uma grande adversidade.”
CONCLUSÃO
Esperem até a semana que vem para decidir sobre demissões ou suspensões de empregados. Isso porque quem demitir antes de alguma dessas medidas ser aprovada não poderá se beneficiar delas.
Precisamos ter paciência para lidar com momentos de pânico. Se até a semana que vem o Governo não apresentar sua resposta às solicitações ai sim é válido tomar precauções extremas, como as demissões.
Ressalta-se que o Ministério da Economia tem agido com celeridade em relação aos pleitos, pelo menos essa foi a resposta que obtivemos quando trabalhos com os pleitos do setor turístico e, junto com a atuação integrada do setor, possivelmente haverá o salvamento de 13,5 millhões de empregos.
Enquanto isso se
possível mantenham regime de homeoffice ou teletrabalho, entregas por delivery,
atendimentos on-line, redução da jornada de trabalho e redução proporcional do
salário em até 25%.
[1] § 1º – O primeiro ano de duração do contrato por prazo indeterminado é considerado como período de experiência, e, antes que se complete, nenhuma indenização será devida.
§ 2º – Se o salário for pago por dia, o cálculo da indenização terá por base 25 (vinte e cinco) dias
§ 3º – Se pago por hora, a indenização apurar-se-á na base de 200 (duzentas) horas por mês.
§ 4º – Para os empregados que trabalhem a comissão ou que tenham direito a percentagens, a indenização será calculada pela média das comissões ou percentagens percebidas nos últimos 12 (doze) meses de serviço.
§ 5º – Para os empregados que trabalhem por tarefa ou serviço feito, a indenização será calculada na base média do tempo costumeiramente gasto pelo interessado para realização de seu serviço, calculando-se o valor do que seria feito durante 30 (trinta) dias.
[2] https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/03/19/coronavirus-cni-propoe-flexibilizar-regras-para-suspensao-do-contrato-de-trabalho.ghtml
[3] https://www.poder360.com.br/opiniao/economia/os-empreendedores-no-combate-ao-coronavirus-por-carlos-melles/