A reforma trabalhista (Lei nº 13.467/17) apresentou a empregados e empregadores uma nova possibilidade de solução de conflitos: o acordo extrajudicial. É um procedimento de jurisdição voluntária, ou seja, não há lide, apenas o pedido para que o juiz homologue o acordo para produção de efeitos
O Processo de Homologação de Acordo Extrajudicial está disposto nos arts. 855-B a 855-E da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
E qual o momento para firmar o acordo?
A Justiça Trabalhista, uma das mais céleres da Justiça Brasileira, ainda enfrenta um congestionamento de processos, tendo casos que duram décadas. Por isso,entendemos que é sempre melhor buscar o acordo antes de uma ação judicial, tanto para o empregado quanto para o empregador.
Para o empregado, por vezes é melhor receber suas verbas pelo acordo, que é executado de forma mais rápida do que pelo processo. Enquanto após o acordo ele pode receber o valor devido em um mês, em um processo pode ser que demore anos para receber.
Para o empregador, o acordo possibilita que os prejuízos da empresa sejam mitigados, visto que ambas as partes poderão acordar a forma do pagamento. Além disso, evita-se condenações como danos morais e multas que podem chegar a valores exorbitantes.
O acordo permite que as partes negociem o que é melhor para ambas. A demanda é judicializada, ela é decidida pelo juiz, que pode tanto ser rígido quanto benevolente. Além disso, há o valor dos honorários de sucumbência para quem perder a demanda.
O acordo pode ser realizado: enquanto perdurar o contrato e após o fim do contrato (casos de demissão).
Portanto, o processo judicial contencioso oferece mais riscos às partes, visto que depende da decisão de interpretação de terceiro (juiz) do que o acordo que as partes poderão negociar os seus termos – porém não livremente, conforme exporemos a seguir.
Como funciona a homologação?
O art. 855-B da CLT determina que o processo de homologação de acordo extrajudicial terá início por uma petição conjunta, sendo obrigatória a representação das partes por advogado.
As partes precisam ter advogados distintos e ambos dever assinar a petição que conterá os termos do acordo. O trabalhador não é obrigado a contratar o advogado do sindicato da sua categoria, sendo apenas uma faculdade. Porém, é obrigado a constituir ou um advogado ou um defensor público para assinar a petição conjunta e o acordo.
Após o protocolo da petição, o juiz terá 15 (quinze) dias para analisar os termos do acordo, designar uma audiência se considerar necessário e proferirá a sentença.
Ressalta-se que a petição de homologação de acordo extrajudicial suspende o prazo prescricional da ação quanto aos direitos nela especificados. Portanto, se no acordo há alusão a verbas devidas por horas extraordinárias, este tema ficará com a prescrição suspensa enquanto não houver decisão sobre o deferimento ou não da homologação. O prazo prescricional volta a fluir no primeiro dia útil seguinte à decisão do juiz sobre a homologação ou não do acordo.
O juiz pode não homologar o acordo?
Sim. O magistrado não tem obrigação de homologar o acordo, principalmente se ele estiver em desacordo com os requisitos. Se a petição conjunta só estiver assinada por um advogado, ou se ambas as partes tiverem o mesmo advogado, o acordo não será homologado
110- JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. ACORDO EXTRAJUDICIAL. RECUSA À HOMOLOGAÇÃO. O JUIZ PODE RECUSAR A HOMOLOGAÇÃO DO ACORDO, NOS TERMOS PROPOSTOS, EM DECISÃO FUNDAMENTADA (Enunciado nº 110 da 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho).
No Enunciado nº 123 da 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho, foi estipulado que não basta apenas os requisitos formais do art. 855-b da CLT, mas que o acordo também siga os requisitos previstos nos arts. 840 a 850 do Código Civil.
123- HOMOLGAÇÃO DE ACORDO EXTRAJUDICIAL I – A FACULDADE PREVISTA NO CAPÍTULO III-A DO TÍTULO X DA CLT NÃO ALCANÇA AS MATÉRIAS DE ORDEM PÚBLICA II- O ACORDO EXTRAJUDICIAL SÓ SERÁ HOMOLOGADO EM JUÍZO SE ESTIVEREM PRESENTES, EM CONCRETO, OS REQUISITOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 840 A 850 DO CÓDIGO CIVIL PARA A TRANSAÇÃO III- NÃO SERÁ HOMOLOGADO EM JUÍZO O ACORDO EXTRAJUDICIAL QUE IMPONHA AO TRABALHADOR CONDIÇÕES MERAMENTE POTESTATIVAS, OU QUE CONTRETIE O DEVER GERAL DE BOA-FÉ OBJETIVA (ARTS. 122 E 422 DO CÓDIGO CIVIL).
O magistrado também pode homologar o acordo apenas parcialmente, ou seja, retirar as partes do acordo que ele entenda que não possam ser homologadas. Da decisão de indefere o pedido de homologação do acordo e da que defere apenas parcialmente cabe recurso ordinário.
E como deve ser feito o acordo para ele ter validade? Quais são os requisitos?
Os aspectos meramente formais são os estipulados nos arts. 855-B e seguintes da CLT, quais sejam:
- Petição conjunta
- Representação por advogados distintos
Outros requisitos documentais essenciais vistos em jurisprudência:
- CTPS
- Contrato de Trabalho
- Ficha de registro do empregado
- Termo de rescisão de contrato de trabalho
- Comprovante de quitação das verbas rescisórias
Requisitos materiais do acordo:
- Qualificação das partes
- Contexto fático da relação de empregado, com a identificação da relação jurídica e as obrigações pactuadas
- O valor do acordo
- As verbas devem ser discriminadas, com valor e natureza
- Cláusula penal (multa em caso de descumprimento)
- Pedido de Justiça Gratuita, ou adiantamento das custas
- Atribuição de responsabilidade pelos recolhimentos fiscais e previdenciários.
- Informação dos pontos controvertidos, ou de situações especiais da empresa que justifiquem a necessidade de homologação
- Quitação das verbas rescisórias
- Valor razoável
- Informação das concessões recíprocas
- Assinatura das partes com reconhecimento de firma
- Cálculo do valor estimado dos direitos (de acordo com os pontos controvertidos)
- Utilização de valor médio para os cálculos
- Reconhecimento do vínculo empregatício
- Liberação de guias para saque do FGTS e concessão do seguro-desemprego[1]
É vedado que no acordo tenha:
Como o juiz avalia os termos para o trabalhador não sair perdendo?
O juiz irá avaliar se o acordo trata de direitos que são indisponíveis – e que, neste caso não podem ser negociados em acordo – como os direitos de personalidade, salário mínimo e direitos sociais (como depósito do FGTS). Também precisará avaliar se as concessões são recíprocas, porque se apenas um lado “ganha” com o acordo ele não pode ser homologado, e se o cálculo dos valores é condizente com o valor médio de mercado e se o acordo obedece aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.
Quais são os parâmetros legais para firmar o acordo – o funcionário pode renunciar a quais direitos?
Há uma limitação dos direitos que o funcionário pode renunciar. No caso ele não pode renunciar dos que são considerados absolutamente indisponíveis, como o pagamento do INSS ou aceitar receber menos do que um salário mínimo por jornada completa de trabalho.
Compreendemos ser razoável seguir, por analogia, o disposto no Art. 611-B da CLT que trata sobre os objetos ilícitos de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, ou seja, dos objetos que não podem ser reduzidos ou suprimidos em nenhum acordo, quais sejam:
I – normas de identificação profissional, inclusive as anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social
II – seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário
III – valor dos depósitos mensais e da indenização rescisória do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS);
IV – salário mínimo;
V – valor nominal do décimo terceiro salário;
VI – remuneração do trabalho noturno superior à do diurno;
VII – proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa;
VIII – salário-família;
IX – repouso semanal remunerado
X – remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em 50% (cinquenta por cento) à do normal
XI – número de dias de férias devidas ao empregado
XII – gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal
XIII – licença-maternidade com a duração mínima de cento e vinte dias;
XIV – licença-paternidade nos termos fixados em lei;
XV – proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei;
XVI – aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei;
XVII – normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho
XVIII – adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas
XIX – aposentadoria
XX – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador;
XXI – ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho;
XXII – proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador com deficiência;
XXIII – proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos
XXIV – medidas de proteção legal de crianças e adolescentes;
XXV – igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso
XXVI – liberdade de associação profissional ou sindical do trabalhador, inclusive o direito de não sofrer, sem sua expressa e prévia anuência, qualquer cobrança ou desconto salarial estabelecidos em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho;
XXVII – direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender;
XXVIII – definição legal sobre os serviços ou atividades essenciais e disposições legais sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade em caso de greve;
XXIX – tributos e outros créditos de terceiros
XXX – as disposições previstas nos arts. 373-A, 390, 392, 392-A, 394, 394-A, 395, 396 e 400 da CLT.
Se não tem carteira assinada, ou seja, não há vínculo formal de emprego, ele pode renunciar ao 13º e férias para não discutir a questão no judiciário?
A falta de assinatura da CTPS quando há vínculo empregatício configura fraude ou trabalho clandestino, portanto não recomendamos a contratação de funcionários se o empregador não for assinar sua CTPS.
Ao assinar o acordo será reconhecido o vínculo empregatício, portanto, independentemente de CTPS assinada ao não, o empregado terá acesso a todos os direitos que o teria se tivesse carteira assinada. Assim sendo, ele não poderá negociar os direitos que foram elencados no tópico anterior como o 13ª e as férias.
Se não recolher as verbas do INSS, o Procuradoria do INSS é automaticamente chamada ao processo?
O recolhimento do INSS não é negociável e deve ser realizado. Caso não seja realizado antes do acordo é possível que ele não seja homologado. Caso após a homologação do acordo não haja o recolhimento é possível que o trabalhador ajuíze uma execução para o recolhimento das verbas e, além disso, o empregador está sujeito ao pagamento de multa pelo não recolhimento da verba. O reconhecimento do vínculo empregatício na Justiça do Trabalho, gera prova material para que a Procuradoria do INSS instaure uma ação contra o empregador. Ela não irá participar do processo do acordo, mas terá ciência do ocorrido.
O que acontece se o juiz indeferir o acordo? Tenho de pagar honorários de sucumbência.
O
Juiz irá encerrar o processo sem resolução de mérito, sendo que este processo
será arquivado. Não há condenação em honorários de sucumbência porque o
processo de homologação de acordo extrajudicial é um processo de jurisdição
voluntária, ou seja, não há parte vencedora e vencida para poder haver a
condenação em honorários sucumbenciais.
[1] https://www.valordotrabalho.com.br/como-realizar-um-bom-acordo-extrajudicial-trabalhista-parte-I.php