O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar na última quarta-feira (13/02 /2019) a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26 e o Mandado de Injunção (MI 4733). O julgamento deve ser retomado amanhã, 20/02.
As ações requerem que o STF declare a omissão do Congresso Nacional por não ter elaborado uma legislação criminal que puna todas as formas de homofobia e transfobia, além de estabelecer um prazo para que o legislativo atue em relação ao tema.
De acordo com o Partido Popular Socialista (PPS), autor da ADO 26 a omissão em face do Congresso Nacional se dá por conta de que o projeto de lei (PL 5.003/2001), que dispõe sobre as sanções aplicáveis às condutas homofóbicas, está há 18 anos sem ter sequer sido iniciada as votações.
Além disso, a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transexuais (ABGLT), autora do MI 4733, entende ser necessário criar um entendimento de que a homofobia e a transfobia são espécies de racismo e que, por isso, se justificaria que fosse elaborada uma legislação criminal que puna crimes voltados a esse grupo.
De acordo com as estatísticas publicadas pelo Grupo Gay da Bahia, o Brasil registrou 420 casos de assassinatos de homossexuais em 2018, cerca de uma pessoa a cada 20 horas, o que faz do país o campeão mundial de crimes contra as minorias sexuais.
A violência contra a comunidade LGBTQ também foi confirmada pela ONG Transgender Europe (TGEu), que constatou ser o Brasil o país com mais registros de homicídios de pessoas transgêneras no mundo. De acordo com o levantamento, entre 1º de outubro de 2017 e 30 de setembro deste ano, 167 transexuais foram mortos no Brasil. A pesquisa, feita em 72 países, classificou o México em segundo lugar, com 71 vítimas, seguido pelos Estados Unidos, com 28, e Colômbia, 21.
Embora os dados sejam desconcertantes, o Legislativo afirma não haver uma omissão inconstitucional ou obstáculos aos exercícios dos direitos à liberdade e à igualdade dos cidadãos.
Silenciamento das religiões e ameaça à separação de poderes?
O advogado-geral da União, André Luiz de Almeida Mendonça, defendeu que não há omissão do Congresso em relação a debater a criminalização da homofobia. Além disso, afirmou que não há um comando Constitucional que determine à criminalização da LGBTfobia.
De acordo com Mendonça, os crimes contra LGBT’s devem continuar a serem julgados como homicídio, lesão corporal ou crime contra a honra até que o Congresso se pronuncie sobre o tema.
O entendimento do advogado-geral da União foi apoiado pelo Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, que afirmou em sua conta do twitter que “não há na Constituição a obrigação de que o Poder Legislativo criminalize a “homofobia” e, dessa forma, não é possível citar mora legislativa para justificar o uso da ferramenta do mandado de injunção”.
Além disso, o entendimento contrário à criminalização afirma que seria uma afronta a separação de poderes, uma vez atenta contra a competência legislativa de tratar sobre o tema.
A Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure), defendeu que a criminalização da LGBTfobia é uma ameaça à liberdade de crença dentro das igrejas e que, embora a Anajure “não sustenta nenhum tipo de ataque contra a população LGBT”, as religiões querem continuar “pregando os textos bíblicos sem correr o risco de serem punidos por um fato social”.
STF como guardião do constitucionalismo.
O vice-procurador-geral da República (vice PGR), Luciano Mariz Maia, defendeu a criminalização da LGBTfobia. Para Maia, o STF tem a obrigação de garantir o direito à vida e oferecer proteção legal a todos.
O ministro Celso de Mello, relator da ADO 26, acompanhou o entendimento do vice PGR, ao deixar claro em seu voto que de que há uma omissão do Legislativo que não pode ser tolerada.

Mello, entretanto, defendeu que não cabe ao Supremo estabelecer uma tipificação penal para o crime de LGBTfobia, pois ao criar uma lei e uma pena, o Judiciário substituiria o legislativo.
O voto do ministro, ao que tudo indica, será pelo posicionamento de estabelecer uma data para que o legislativo vote sobre o tema. Para o relator, a comunidade LGBT sofre de uma violência motivada pelo preconceito, ódio e racismo.
“Nada é mais nocivo, perigoso e ilegítimo do que elaborar uma Constituição sem a vontade de fazer executá-la integralmente”, afirmou Mello, que deverá finalizar seu voto na próxima quarta-feira, dia 20.

*Giovanna Ghersel é advgoada, graduada pelo UniCEUB, com pós-graduação em Direito Penal e Processo Penal pelo IDP. É associada ao escritório Lima, Nunes e Volpatti Advocacia, com foco em Direito Penal e Digital.