O livramento condicional é um instituto cujo a inspiração e fundamentação reside na teologia da Execução Penal, mais especificamente, na finalidade declarada pelo art. 1ª da Lei 7.210/84 “A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”.
Trata-se da expectativa de efetivar o cumprimento da pena construindo condições para que o condenado possa se reintegrar paulatinamente ao convívio social. Pois, o livramento condicional busca inserção do sujeito ao estado de liberdade, sendo aplicável aos condenados que não mais reclamam uma medida de contenção, em face de seu específico potencial criminógeno.
A concessão do livramento condicional permite o acompanhamento do recluso em seu reencontro com a liberdade plena. Constitui o instituto um rompimento com a concepção puramente aritmética das penas privativas de liberdade, vale dizer nesse caso, que o tempo de prisão nem sempre corresponderá àquele fixado na sentença penal condenatória.
Os requisitos para adentrar no livramento condicional estão previstos no art. 83, do Código Penal Brasileiro, no qual possibilita ao condenado de pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, que se enquadre nas seguintes hipóteses:
- Cumprimento de mais de ⅓ da pena não sendo reincidente em crime doloso e possuir bons antecedentes.
- Cumprimento de mais da metade da pena se o condenado for reincidente em crime doloso
- Tenha realizado a reparação, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração;
- Cumprimento mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza.
Além disso, o legislador impõe requisitos subjetivos a serem verificados, como:
- O bom comportamento durante a execução da pena
- Não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses
- Bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído
- Aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto.
É necessário ressaltar que apesar da previsão do condenado em crime hediondo ou equiparado ter o direito ao instituto desde que cumpra a quantidade da pena especificada e não seja reincidente, com a nova previsão do art. 112, VII da Lei de Execuções Penais, dada pela Lei 13.964/2019, gerou a possibilidade da aplicação do instituto ao condenado pela mesma hipótese, sendo este reincidente, mas desde que não tenha contribuído para o resultado morte.
Todavia, esse entendimento ainda não é totalmente pacificado entre os doutrinadores e tribunais, havendo divergência sobre a interpretação da norma. Diante disso, apresenta-se, a título de conhecimento, uma jurisprudência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios que trata sobre esse assunto:
AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL. LIVRAMENTO CONDICIONAL. CONDENADO REINCIDENTE ESPECÍFICO EM CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO. TRÁFICO DE DROGAS. REQUISITO OBJETIVO NÃO PREENCHIDO. ARTIGO 83 DO CÓDIGO PENAL. NOVA REDAÇÃO DO ART. 112 PELA LEI Nº 13.964/2019. NÃO OCORRÊNCIA DE REVOGAÇÃO TÁCITA. REQUISITO SUBJETIVO. COMETIMENTO DE NOVOS CRIMES NO CURSO DA EXECUÇÃO. A Lei nº 13.964/2019 não revogou, tacitamente, o inciso V do artigo 83 do Código Penal, tampouco limitou a vedação do livramento condicional aos condenados pela prática de crime hediondo com resultado morte. Conforme o art. 83, V, do Código Penal, sendo o condenado reincidente específico em crime hediondo, prática de tortura, tráfico de drogas, tráfico de pessoas ou terrorismo, não pode ser beneficiado com o livramento condicional. Por sua vez, o novo art. 112 da LEP veda o livramento condicional para os condenados pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, seja ele primário ou reincidente (art. 112, VI, “a”, e VIII, da LEP). Cada norma traz sua especificidade. A vedação do Código Penal inclui o crime de tráfico de pessoas e se limita à reincidência específica. A vedação da LEP limita-se aos crimes hediondos ou equiparados com resultado morte. Daí que as duas normas convivem sem conflito. Extrai-se que é possível o livramento condicional para o condenado por crime hediondo ou equiparado, sem resultado morte, desde que seja primário ou reincidente genérico. Havendo resultado morte em tais crimes, está vedado o livramento condicional tanto para o condenado primário quanto para o reincidente, genérico ou específico. No caso de tráfico de drogas, o livramento condicional encontra vedação específica no art. 44, parágrafo único, da Lei nº 11.343/2006. Compreende-se, nos termos da Súmula nº 441 do Superior Tribunal de Justiça, atinente ao requisito objetivo, disciplinado no caput e incisos I, II e V do artigo 83 do Código Penal, que “a falta grave não interrompe o prazo para obtenção de livramento condicional”. Para a concessão do livramento condicional, além do requisito objetivo (incisos I, II e V e caput do artigo 83), deve ser considerado o requisito subjetivo (inciso III do artigo 83), que abrange o “bom comportamento durante a execução da pena” (alínea “a”); o “não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses” (alínea “b”); o “bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído” (alínea “c”); e a “aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto” (alínea “d”). Não há contradição entre as alíneas “a” (bom comportamento durante a execução da pena) e “b” (não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses) do inciso III do artigo 83 do Código Penal. Exige-se, além do não cometimento de falta grave nos últimos doze meses, bom comportamento durante toda a execução da pena. Na espécie, apesar de não ter cometido falta grave nos últimos doze meses, atendendo o requisito da alínea “b”, o agravante, antes disso, “durante a execução da pena”, não teve “bom comportamento”, desatendendo o requisito da alínea “a”, porque praticou crimes dolosos (receptação e tráfico de drogas), revelando não ser dotado do senso de responsabilidade que se espera do agraciado com o livramento condicional. No livramento condicional, o espaço temporal, no qual se deve aferir o “bom comportamento” do sentenciado, abrange todo o período de execução da pena, não apenas parte dele (art. 83, III, “a”, do Código Penal, na nova redação da Lei nº 13.964/2019). Não se pode restringir o alcance da norma federal em exame por normas da legislação distrital ou normas administrativas do Sistema Carcerário. Livramento condicional fundamentadamente indeferido, por não satisfeitos os requisitos objetivo e subjetivo (alínea “a” do inciso III do artigo 83 do Código Penal). Agravo desprovido.
(Acórdão 1316036, 07460499120208070000, Relator: MARIO MACHADO, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 4/2/2021, publicado no PJe: 12/2/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada.)
Em ato contínuo, o parágrafo único do art. 83, do Código Penal, possui a previsão que na hipótese do condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça, a concessão do livramento condicional ficará subordinada ao juízo de valor do próprio juiz que avaliará condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir.
Como ficaria o sujeito que não cometeu um crime hediondo e não equiparado ao hediondo, sendo réu primário, e condenado possuindo apenas maus antecedentes. Ele terá direito ao livramento condicional? Se sim, qual é o requisito objetivo aplicado a ele?
Vemos que nessa situação, o legislador não dispõe de maneira clara a sua solução. Todavia se presume que o sujeito do caso possui o direito ao livramento condicional, pois se o reincidente tem, o direito deve abranger a quem não for.
O requisito objetivo aplicado ao sujeito, em relação ao quantum de pena que o primário portador de maus antecedentes deverá cumprir, é dado pela analogia, pois não há previsão normativa direcionada.
Busca aproximar a situação do portador primário de bons antecedentes com a situação do primário portador de maus antecedentes, resultando no cumprimento de mais ⅓ da pena para o livramento condicional. Não possível em hipótese alguma, a aproximação do primário portador de maus antecedentes, com a situação do reincidente em crimes dolosos, pois seria uma analogia prejudicial ao Réu, e não permitido pelo Direito Penal.
Por fim, a revogação do livramento condicional pode se dar de maneira obrigatória (art. 86, CP) ou de forma facultativa (art. 87, CP). A primeira ocorre se durante a ocorrência do livramento, o liberado vem a ser condenado à pena privativa de liberdade, em sentença irrecorrível, por crime cometido durante a vigência do benefício ou por crime anterior ao ingresso no livramento condicional. Na segunda hipótese, o juiz facultativamente poderá revogar o benefício no caso do liberado deixar de cumprir qualquer das obrigações constantes da sentença, ou for irrecorrivelmente condenado, por crime ou contravenção, a pena que não seja privativa de liberdade.
A revogação, sendo ela obrigatória ou facultativa, obsta a concessão novamente do livramento condicional para o mesmo sujeito. Se a revogação decorre por resultado de condenação por outro crime anterior àquele benefício, a pena nova da condenação será somada com o período de pena que tinha a ser cumprida integralmente quando ingressou ao livramento condicional.
Já a extinção do livramento condicional se dará se até o seu término o benefício não for revogado. Trata de uma decisão declaratória, pois a extinção se dá por força da lei. Neste ponto, vale ressaltar que o entendimento do Supremo Tribunal Federal e o Supremo Tribunal de Justiça, convergem igualmente, na impossibilidade do juiz retardar a decisão da extinção da pena ainda quando devido à falta de ciência da condenação intercorrente, pois o mero decurso de tempo, sem que o Magistrado tenha sido cientificado da ocorrência de fato que, ex vi legis, acarreta a revogação do livramento condicional, basta para a sua extinção.