PENA RESTRITIVA DE DIREITOS: A SUA APLICAÇÃO A LUZ DO ORDENAMENTO BRASILEIRO

Inicialmente, é importante lembrar que a pena restritiva de direito é uma das 3 espécies de penas estabelecidas pelo nosso ordenamento penal, e aparece sempre em substituição à pena privativa de liberdade. Trata-se de uma pena alternativa a da prisão, no qual é feita a conversão da pena originária, que seria a pena de prisão, por uma pena mais branda ao condenado.

O juiz da sentença é o responsável pela substituição da pena de prisão para a restritiva de direitos. Contudo, após a substituição, uma vez transitada em julgado a sentença, o juiz das execuções, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, promoverá a devida execução, podendo, para tanto, requisitar a colaboração de entidades públicas ou solicitá-las a particulares. (Art. 147 da Lei de Execução Penal)

Além disso, é possibilitado ao juiz da Execução, de maneira motivada, alterar a forma de cumprimento das penas de prestação de serviços à comunidade e de limitação de fins de semana, ajustando-as às condições pessoais do condenado e as características do estabelecimento, da entidade ou do programa comunitário ou estatal. (art. 148, da Lei de Execução Penal)

Neste viés, a pena restritiva de direitos pode se dar em diversas possibilidades, sendo elas: prestação pecuniária, perda de bens e valores, limitação de fim de semana, prestação de serviços à comunidade e interdição de direitos. Como é previsto no rol taxativo do art. 43, do Código Penal:

Art. 43. As penas restritivas de direitos são: (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)

I – prestação pecuniária; (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)

II – perda de bens e valores; (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)

III – limitação de fim de semana. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 1984)

IV – prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas; (Incluído pela Lei nº 9.714, de 25.11.1998)

V – interdição temporária de direitos; (Incluído pela Lei nº 9.714, de 25.11.1998)

VI – limitação de fim de semana. (Incluído pela Lei nº 9.714, de 25.11.1998)

Todavia, apesar do seu rol taxativo, podem ser aplicadas de diversas formas considerando a sua natureza. Um exemplo dessa mobilidade, é a previsão do artigo supracitado, que prevê a prestação pecuniária como uma das penas restritivas de direito, porém o juiz pode ordenar que a prestação pecuniária seja propriamente dita (no sentido de pagamento em dinheiro), ou cujo a prestação pode se calcular em pecúnia (ex. entrega de x quantidades de cestas básicas).

Já os requisitos da substituição da pena privativa de liberdade para a restritiva de direitos, se encontra no art. 44 do Código Penal:

Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)

I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;(Redção dada pela Lei nº 9.714, de 1998)

II – o réu não for reincidente em crime doloso; (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)

III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente. (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)

§ 1o (VETADO)  (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)

§ 2o Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos; se superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos.  (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)

§ 3o Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime. (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)

§ 4o A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta. No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos, respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão.  (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)

§ 5o Sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade, por outro crime, o juiz da execução penal decidirá sobre a conversão, podendo deixar de aplicá-la se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva anterior. (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)

Ressalta-se o entendimento já firmado entre os tribunais brasileiros e a doutrina, no qual uma vez preenchidos os requisitos necessários, torna-se direito subjetivo do condenado, não se valendo de decisão discricionária do magistrado para sua substituição.

AGRAVO EM EXECUÇÃO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. SENTENÇA CONDENATÓRIA. DETERMINAÇÃO DE EXAME DA CONVENIÊNCIA DA BENESSE PELO JUÍZO DA EXECUÇÃO. DIREITO SUBJETIVO DO APENADO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO. RECONHECIDA. I – Equivocada a determinação que relega a análise da “conveniência” de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos para o Juízo da Execução, considerando que a questão deve ser examinada na sentença condenatória, nos termos do art. 59, IV, do CP. Ademais, não há que se falar em “conveniência”, considerando que, presentes os pressupostos dispostos no art. 44 do CP, a substituição da pena é direito subjetivo do réu. II – Nada obstante, se a sentença condenatória transferiu a responsabilidade de apreciar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ao Juízo das Execuções, este não pode se esquivar de analisar a questão, sob pena de impor prejuízo ao recorrente. III – Aplicando-se, por analogia, o disposto no art. 66 da LEP, conclui-se que também compete ao Juízo das Execuções decidir sobre a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, notadamente por se tratar de questão que terá reflexos no cumprimento da pena anterior que está em curso. IV – Recurso conhecido e provido.

(Acórdão 1332010, 07497531520208070000, Relator: NILSONI DE FREITAS CUSTODIO, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 8/4/2021, publicado no PJe: 17/4/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada.)

A duração da pena restritiva de direitos segue a mesma definida quando aplicada a pena privativa de liberdade antes da sua conversão. Desta forma, se o condenado tiver sido sentenciado a 2 anos de reclusão, o juiz poderá substituí-la exatamente por 2 anos pela pena que bem entender suficiente apontada no art. 43 do Código Penal.

A mesma lógica não se aplica às penas restritivas que se referem a perda de bens ou prestação pecuniária, de modo que, uma vez cumpridas, deve ser declarada extinta antes do decurso do tempo apontado na pena originária.

Por fim, é importante ressaltar que em casos de condenação por crimes de violência doméstica, mesmo a pena sendo inferior a 4 anos, é vedada a substituição por pena restritiva de direitos, como disposto na Súmula nº 588 do Superior Tribunal de Justiça.

Súmula 588-STJ: A prática de crime ou contravenção penal contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico impossibilita a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos

A título de conhecimento, em seguida apresento algumas jurisprudências do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, que trata o modo que o juízes aplicam o direito quando o beneficiado com a substituição da pena de prisão por restritiva de direitos, deixa de cumprir as exigências aplicadas pelo juiz.

AGRAVO NA EXECUÇÃO PENAL. CONVERSÃO DA PENA ALTERNATIVA EM PRIVATIVA DE LIBERDADE ANTE AO NÃO COMPARECIMENTO PARA CUMPRIMENTO. NECESSIDADE DE CLÁSULA DE APRESENTAÇÃO IMEDIATA. DECISÃO REFORMADA. 1 O Reeducando foi condenado por furto simples e teve a pena privativa de liberdade substituída por uma restritiva de direitos. Todavia, deixou de comparecer para iniciar o cumprimento após ser intimado por edital, ensejando reconversão definitiva para privativa de liberdade. 2 Em homenagem aos princípios do contraditório e ampla defesa, deve-se garantir ao sentenciado o direito de justificar a ausência em audiência prévia, razão pela qual a reconversão deve ser apenas a título cautelar e não definitivo. 3 Agravo em execução provido. 

(Acórdão 1345072, 07028005620218070000, Relator: CESAR LOYOLA, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 2/6/2021, publicado no PJe: 11/6/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada.)

PROCESSO PENAL. AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. UTILIZAÇÃO DO VALOR DA FIANÇA. ARTIGO 336 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ORDEM DE PREFERÊNCIA DO PAGAMENTO. Embora o artigo 336 do Código de Processo Penal não estabeleça, expressamente, uma ordem de preferência de pagamento das obrigações nele mencionadas, a melhor exegese é a de que, primeiro, utiliza-se o valor da fiança para pagar as custas processuais, de interesse público, em virtude da movimentação do Judiciário. Em seguida, havendo saldo, reparam-se eventuais danos a terceiros e, por fim, utiliza-se o valor para o cumprimento da prestação pecuniária e da multa, de interesse do condenado. Precedentes do STJ. Eventual inadimplência da prestação pecuniária não acarreta automática conversão da pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade. Somente o descumprimento injustificado acarretaria tal conversão, pois, se a inadimplência é justificada pela hipossuficiência financeira posterior (desemprego/ausência de rendimentos), a Lei de Execução Penal autoriza outras soluções, a exemplo da redução das prestações, do seu parcelamento maior ou da substituição da pena restritiva por outra modalidade diversa da prestação pecuniária. Mantida, no caso concreto, a conversão do restante da prestação pecuniária em prestação de serviços à comunidade, após utilização do valor da fiança para pagamento das custas e de parte da pena pecuniária, considerando o recurso exclusivo da defesa.   Agravo provido em parte. 

(Acórdão 1325596, 07525592320208070000, Relator: MARIO MACHADO, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 11/3/2021, publicado no PJe: 19/3/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada.)

Desta forma, se conclui que a pena restritiva de direitos é um direito subjetivo do Réu condenado, que se aplica quando preenchidos todos os requisitos necessários e expressos na lei, através do juízo da condenação. Dada a natureza do benefício, a pena restritiva de direitos só poderá ser convertida em pena privativa de liberdade quando ocorrer a sua eventual inadimplência. Todavia, o juiz deve conceder ao condenado a oportunidade de se justificar, sendo apenas na ocorrência de inadimplemento sem fundamentos causa suficiente para o retorno a pena de prisão.

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